Os gauleses saqueiam Roma 390 a.e.c.
As grandes migrações dos celtas
Não se sabe muito bem porque, a partir do século V antes de nossa era, os celtas. provenientes da bacia fluvial parisiense, da Alemanha, da Suiça e da Áustria, começam uma série de migrações quer para o sul, quer ao longo do Danúbio em direção do mar Negro! Em dezenas de milhares, esses guerreiros do norte, seguidos de carroças levando mulheres e crianças, invadem em ondas sucessivas a Itália, a Europa central e a Ásia Menor.
Excetuando episódios violentos, essa expansão celta não se traduz numa colonização maciça dos territórios conquistados. No século IV, é a Itália do norte (a futura GáIia Cisalpina) que é invadida, em seguida Roma e, finalmente, a costa adriática. Outros celtas avançam ao longo do Danúbio, na Iugoslávia, na Hungria, na Macedônia e na Trácia. Uma incursão de celtas chega em 279 até Delfos, cujo tesouro é em porte pilhado. Finalmente, um último grupo passa para a Ásia Menor em torno do ano 275 e se estabelece no centro da região, numa área que lhes deve seu nome, a Galícia.
Mapa da migração na península itálica.
A batalha de Ália
Busto de Breno
A tomada de sua cidade pelos celtas é vivida como uma catástrofe pelos romanos que, no inicio do século IV, estão prestes a tornar-se uma potencia italiana destacada. O próprio futuro de Roma parece realmente em jogo e, por desânimo, muitos pensam em abandonar o local da cidade.
Quando os gauleses. instalados no norte da Itália havia varias décadas, começam a descer para a Etrúria ao Lácio, os romanos não estão preparados para essa invasão, pois, a situação é extremamente confusa na Itália. Com efeito, o declínio dos etruscos foi sancionado em 395 pela tomada de sua praça-forte, Veies, pelos romanos sob o comando do grande general Camilo. Mas este, caindo em desgraça, teve de partir para o exílio em seguida, lutas interinas dividem os políticos romanos que minimizam em público o perigo do avanço celta. Depois de se apoderar de Clusium (Chiusi), à qual Roma recusou sua ajuda, os gauleses têm o campo livre. Em marcha forçada, dirigem-se para o sul, semeando o terror com seus cantos selvagens, seus gritos e seus armamentos desconhecidos. É assim que, em julho de 390, chegam à confluência do Ália com o Tibre, a somente 16 quilômetros de Roma.
Na ausência de um chefe supremo, os tribunos militares (oficiais) concordam em convocar para o combate todos os adultos válidos - ou seja, um grande número de homens, mas cuja maioria desconhece totalmente o manejo das armas. Sem plano de batalha, sem homogeneidade no comando, sem ritos religiosos propiciatórios, nada é feito segundo as regras... Por isso não é de se surpreender que, no primeiro choque, os romanos sejam vergonhosamente postos em debandada. A maioria foge sem mesmo ter combatido. Em vez de voltar para Roma, onde se encontram suas famílias, muitos preferem ir a Veies e a outras cidades das redondezas. Somente a ala direita de seu exército retoma à Urbs (a capital) e, esquecendo de fechar as portas do cidade, os soldados romanos procuram refúgio na cidadela do Capitólio.
Senadores ou estátuas?
No momento, os gauleses não ousam acreditar numa vitória tão repentina e temem uma armadilha. No final da tarde, no entanto, ales se põem em marcha para Roma, Cavaleiros enviados como batedores trazem a notícia de que a cidade está aberta e que não há nenhum vestígio de defensores! É uma nova fonte de perplexidade para os gauleses, que se contentam em tomar posição entre Roma e o rio Anio. Essa hesitação se volta finalmente em proveito daqueles que se encontram na cidade. Sucedendo ao primeiro movimento de pânico, uma atividade febril toma conta dos romanos, que consolidam as fortificações do Capitólio, para nele se encerrar, providos de armas e alimentos. Ao mesmo tempo, os sacerdotes se preocupam em pôr ao abrigo os "objetos sagrados" protetores de Roma: alguns fetiches são enterrados em jarras perto do Fórum, os outros são levados pelas vestais, ou virgens que mantêm o fogo sagrado, que deixam a cidade com uma multidão de plebeus. A exceção dos homens entrincheirados no Capitólio, só permanecem então em Roma os senadores idosos, que tomaram a decisão de se oferecer em sacrifício pela patina. Cada um deles, revestido com a toga de púrpura e bordada com ouro e com as insígnias oficiais de sua função, senta-se num banco de marfim no vestíbulo de sua residência. Quando os gauleses e seu chefe Breno penetram na cidade pela porta Colina, o silêncio nas ruas desertas é impressionante. Nas casas dos senadores, os bárbaros percebem homens sentados, imóveis, trajando vestimentas brilhantes e que têm nas mãos um bastão de marfim. Supõem, de início, que se tratam de estátuas e, para assegurar-se, um deles puxa a longa barba de um dos personagens imóveis. Recebe então um golpe de bastão que o mata... É o sinal do massacre geral desses homens veneráveis e, durante vários dias, os gauleses pilham e saqueiam as casas, depois ateiam logo nelas.
"Vae victis!"
Breno, chefe gaulês, e Marco Fúrio Camilo, depois do Cerco de Roma. Ilustração de "Histoire de France en cent tableaux", por Paul Lehugeur, Paris, 1886.
A vingança parcial dos romanos chega pouco depois. Com eleito, fora da cidade, os habitantes refugiados nas cidades do Lácio começaram a organizar a revanche. Anistiado e de volta do exílio, Camilo dirige as operações. De acordo com Tito Lívio, quando os bárbaros deixaram a cidade, ter-se-iam defrontado com o exército deste, que os teria posto em fuga. Mas a invasão deixa um trauma duradouro nos romanos: o horror das experiências vividas e a visão de sua cidade devastada são tão desencorajadores que vários responsáveis políticos propõem emigrar para Veies. Somente um longo discurso de Camilo, insistindo na necessidade de permanecer num local escolhido pelos deuses, persuade senadores e plebeus a reconstruir a cidade sobre seu local de origem.
Referências bibliográficas:
ARNOLD, B. e GIBSON, D. B. Celtic Chiefdom, Celtic State: Cambridge, 1995;
DAVIES, J. A. The Celts: Prehistory to the Present Day: Londres, 2000;
KING, A. Roman Gaul And Germany: Londres, 1990;
RANKIN, D. Celts And the Classical World: Londres, 1987.